O que se propõe para a escola é uma estrutura de betão corrente e despojada de artifícios que origina dois pisos e dois espaços de características opostas. O piso inferior organiza o programa de uma forma flexível e potencialmente reorganizável a cada momento de reconfiguração das práticas pedagógicas e o piso superior onde se desenvolvem os espaços de cariz mais público e uma praça que procura centralizar uma nova urbanidade aberta num território demasiadamente enclausurado por estruturas condominiais encerradas sobre si próprias.

Imagens

Memória descritiva

Que escola teremos em 2050?

Remetendo-nos ao que conseguimos dominar, não faz sentido desenhar uma escola para ser construída nos próximos anos sem colocar como eixo central a questão climática. Na proposta que apresentamos a concurso consideramos três estratégias decisivas:

a) Construção: reutilização dos resíduos produzidos pela demolição dos edifícios e escavações;

b) Climatização: utilização de um sistema de aquecimento geotérmico que aproveite a proximidade do mar;

c) Aproximação: fortes condicionamentos no acesso viário à escola para promoção da deslocação por meios pedestres e cicláveis.

Sendo certo que há materiais com melhor comportamento ambiental que o betão, parece-nos pouco eficaz e dogmático retirá-lo das nossas práticas construtivas. No contexto português, parece-nos mais útil pensar de que forma poderemos produzir betão de uma forma mais sustentável do que parar de produzi-lo. Por outro lado, rejeitamos em absoluto a padronização das respostas (e imagens) arquitectónicas pela via da sustentabilidade ou pelo seu condicionamento financeiro.

A solução proposta parte daquela que nos pareceu a atitude mais óbvia perante o programa e o território, localizado no Bairro do Rosário, com forte carácter residencial, a oeste da vila de Cascais. A criação de um plano horizontal à cota da Avenida Pedro Álvares Cabral, que desenvolve dois pisos a partir do declive natural do terreno e que resolve desde logo a questão da acessibilidade universal. Este plano horizontal e os pilares que o suportam são a coluna dorsal da intervenção, à qual a arquitectura juntará os órgãos, os músculos ou a pele que lhes dará sentido.

Ao contrário de outras realidades na Europa, a escola portuguesa é tradicionalmente murada e de acesso reservado. A utilização dos espaços da escola pública por gente “fora da comunidade escolar” só é permitida, em casos extraordinários e, tantas vezes, pela via do aluguer. Não ignorando os problemas de financiamento e as questões de manutenção ou segurança, parece-nos fundamental questionar o papel da escola como um equipamento público estruturante e, desde logo a partir do projecto, promover a discussão em torno dos equipamentos que mais facilmente poderão ser absorvidos pelas populações vizinhas e contrariando a lógica vigente da criação de condomínios ensimesmados.

Assim é definido um primeiro conjunto composto por espaços passíveis de serem abertos à comunidade fora dos períodos lectivos e que ocupam uma posição mais próxima de acesso ao exterior. Destácam-se as áreas desportivas (pavilhão e espaço exterior), auditório e biblioteca com uma posição estratégica de centralidade na Praça.

O espaço escolar mais convencional situa-se no piso inferior de carácter mais reservado. No limite a Sul, junto à entrada principal e portaria, dispõem-se os serviços administrativos e de gestão, que ligam aos espaços de convívio dos alunos. No extremo oposto localizam-se o refeitório e a cantina e um grande espaço polivalente exterior coberto que se projeta em anfiteatro. Articulam-se com espaços de circulação e reunião, tanto interiores como exteriores, que assumem algum protagonismo pela sua dimensão em desenho de proposta.

A proposta critica a concepção da escola na sala de aula, nos espaços formais de aprendizagem e na ideia do espaço controlado e delimitado; explora elementos mais permeáveis como os grandes envidraçados, espaços interiores abertos, flexíveis e adaptáveis a diferentes usos. O programa de aprendizagem desenvolve-se no limite Norte, o espaço da sala de aula normativo baseado na repetição e agregação do seu módulo. As salas quadrangulares, desfasadas entre si, permitem que parte se estenda para o corredor e outras para o pátio. As salas de Artes Visuais e Ciências (laboratórios) abrem-se ao exterior, beneficiando do pinhal.

Essencial no desenho de uma escola para 2050, prende-se com as formas de aproximação e chegada à mesma. Desenvolvemos um projecto em conformidade com as melhores práticas de acesso universal e condicionamento de velocidade automóvel nas suas áreas limítrofes, priorizando os acessos pedonais, cicláveis e por intermédio de motociclo. Estimular o acesso de bicicleta, com programas de formação ao contexto urbano, a criação de parqueamento seguro em frente à escola e o estabelecimento de uma rede ciclável entre escolas e de transporte público.

A proposta, não é apenas uma resposta a um concurso mas, o resultado de uma reflexão sobre o que deve ser uma escola pública e a forma como se deve inserir no seu contexto urbano – físico e social.

A intenção de que esta escola possa ser o centro de uma transformação urbana física e de relação dos residentes com o seu contexto, mas também que seja utilizada e percepcionada como um território de livre utilização e acesso. Um edifício referência que permita cruzamentos e diálogos intersociais, intergeracionais e multiculturais, numa atitude que não dispensa a análise antropológica.

Depois da reabilitação de diversas escolas pelo país, a proposta pretende experimentar aquilo que seria impossível no modelo clássico de produção de escolas em série. Esta escola deve construir-se como um manifesto, uma reflexão crítica capaz de influenciar o posicionamento de outras escolas e em que cada momento da sua construção deve procurar radicalizar as perguntas para obter melhores respostas, na esperança que o dia da inauguração seja apenas o primeiro dia de uma escola que está permanentemente a reinventar-se.

Ficha técnica

Nome do projecto
Escola Secundária de Cascais | Concurso
Categoria geral
Equipamento
Concurso
Cliente
Município de Cascais, Secção Regional Sul da Ordem dos Arquitectos
Parceiros
João Torres
Localização
Bairro do Rosário, a Oeste da vila de Cascais., Portugal
Estado
Projecto
Áreas
20,000
Data de início
2019
Data de conclusão
2020
Arquitectura Paisagista
Adriana Gil
‍Estruturas
BETAR – Eng.º José Pedro Ferreira Venâncio
Hidráulicas
Eng.º Rita Duarte
Eletricidade & Telecomunicações
Blueorizon - Eng.º Mário Boucinha